Maio de 2020
Vocábulos com dupla grafia no UNIVERSO DA LíNGUA
Nas sequências internas
1. Validade
As variantes da lista abaixo registadas presentemente nos países que ainda aplicam a Norma de 945 e no VOLP, em linha, da Academia Brasileira de Letras com e sem a consoante etimológica (cc, cç ct; pc, pç, pt), estariam no Vocabulário Comum (VC) prévio, previsto no Preâmbulo do AO90, com o qual se pretendia obter um vocabulário que fosse válido em todo o universo da língua; mas VC que não foi feito. Nesse VC, as duas variantes, com e sem consoante, seriam forçosamente registadas, logo legítimas no universo da língua, dado existirem ambas no Brasil e porque a variante com a consoante até era única em Portugal e nos PALOP.
Foi este um dos critérios que o autor seguiu no Novo Vocabulário Ortográfico Conciliador do AO90 com a Norma de 1945, permitindo a opção do utente com e sem a consoante na generalidade destas palavras; independentemente das preferências no Vocabulário pessoal do autor, feitas nestes casos como entradas.
2. Lista
| 
   abjecção  | 
  
   adopção  | 
  
   adoptado  | 
  
   adoptar  | 
 
| 
   adoptável  | 
  
   adoptivo  | 
  
   afecção  | 
  
   afectação  | 
 
| 
   afectadamente  | 
  
   afectado  | 
  
   anabaptismo  | 
  
   anabaptista  | 
 
| 
   anafiláctico  | 
  
   assumpcionista  | 
  
   característica  | 
  
   característico  | 
 
| 
   caracterização  | 
  
   caracterizar  | 
  
   caracterizável  | 
  
   cepticismo  | 
 
| 
   circunspecção  | 
  
   coarctação  | 
  
   coarctado  | 
  
   coarctar  | 
 
| 
   colectânea  | 
  
   colectar  | 
  
   colectável  | 
  
   colectivamente  | 
 
| 
   colectividade  | 
  
   colectivismo  | 
  
   colectivista  | 
  
   colectivo  | 
 
| 
   colector  | 
  
   conjectura  | 
  
   conjecturar  | 
  
   conjecturável  | 
 
| 
   contrafactor  | 
  
   dactilografar  | 
  
   dactilografia  | 
  
   dactilográfico  | 
 
| 
   deflectido  | 
  
   deflectir  | 
  
   deflectível  | 
  
   deflector  | 
 
| 
   dejecção  | 
  
   dejectar  | 
  
   desafectação  | 
  
   desafectado  | 
 
| 
   desinfecção  | 
  
   desinfeccionar  | 
  
   desinfectante  | 
  
   desinfectar  | 
 
| 
   distráctil  | 
  
   distractivo  | 
  
   detectar  | 
  
   detective  | 
 
| 
   ejecção  | 
  
   ejectar  | 
  
   ejectável  | 
  
   epiléptico  | 
 
| 
   estupefacção  | 
  
   exactor  | 
  
   excepcional  | 
  
   exceptuar  | 
 
| 
   expectoração  | 
  
   expectorante  | 
  
   expectorar  | 
  
   extractivo  | 
 
| 
   extractor  | 
  
   extrospecção  | 
  
   facção  | 
  
   factor  | 
 
| 
   factorial  | 
  
   factura  | 
  
   flectir  | 
  
   flector  | 
 
| 
   fracção  | 
  
   fraccionar  | 
  
   fraccionário  | 
  
   fraccionável  | 
 
| 
   fractura  | 
  
   fracturar  | 
  
   genuflectir  | 
  
   genuflector  | 
 
| 
   infecção  | 
  
   infeccionar  | 
  
   infeccioso  | 
  
   infectante  | 
 
| 
   infectar  | 
  
   inflectir  | 
  
   infracção  | 
  
   infractor  | 
 
| 
   injector  | 
  
   insecticida  | 
  
   insurreccionar  | 
  
   interjectivo  | 
 
| 
   introspecção  | 
  
   introspectivo  | 
  
   invectiva  | 
  
   invectivar  | 
 
| 
   jacto  | 
  
   leccionação  | 
  
   leccionador  | 
  
   leccionar  | 
 
| 
   lectivo  | 
  
   manufactura  | 
  
   manufacturação  | 
  
   manufacturado  | 
 
| 
   manufacturar  | 
  
   manufacturável  | 
  
   multidireccional  | 
  
   objecção  | 
 
| 
   objectante  | 
  
   objectar  | 
  
   objectável  | 
  
   objectiva  | 
 
| 
   objectivação  | 
  
   objectivamente  | 
  
   objectivar  | 
  
   objectivável  | 
 
| 
   objectividade  | 
  
   objectivo  | 
  
   olfactivo  | 
  
   olfactometria  | 
 
| 
   olfactómetro  | 
  
   perspectiva  | 
  
   perspectivação  | 
  
   perspectivar  | 
 
| 
   perspectividade  | 
  
   primo-infecção  | 
  
   prospectar  | 
  
   putrefacção  | 
 
| 
   rarefacção  | 
  
   readopção  | 
  
   readoptar  | 
  
   rectal  | 
 
| 
   rectangular  | 
  
   rectângulo  | 
  
   rectidão  | 
  
   rectificação  | 
 
| 
   rectificador  | 
  
   rectificar  | 
  
   rectificativo  | 
  
   rectificável  | 
 
| 
   rectiforme  | 
  
   rectilíneo  | 
  
   rectitude  | 
  
   rectovaginal  | 
 
| 
   reflectido  | 
  
   refracção  | 
  
   refractar  | 
  
   refractário  | 
 
| 
   refractivo  | 
  
   refractómetro  | 
  
   refractor  | 
  
   respectivo  | 
 
| 
   retroflectido  | 
  
   retroflectir  | 
  
   retrospecção  | 
  
   retrospectiva  | 
 
| 
   subdialectal  | 
  
   subjecção  | 
  
   susceptibilidade  | 
  
   susceptibilizar  | 
 
| 
   susceptível  | 
  
   tactear  | 
  
   tacteável  | 
  
   tacteio  | 
 
| 
   tumefacção  | 
  
   vector  | 
  
   vectorial  | 
  
   
  | 
 
3. Extrato de algumas considerações no livro
Após a denúncia da Norma de 1945 pelo Brasil, e em seguimento dos aperfeiçoamentos em conjunto que se vinham fazendo depois, os linguistas dos dois países sentiam quer era preciso tentar novamente uma aproximação mais profunda na língua. O problema estava sobretudo na separação existente nas consoantes não articuladas, nessa Norma de 1945 exigidas sempre, mesmo que a consoante não tivesse valor diacrítico, com o argumento de serem necessárias «para respeitar a tradição ortográfica», o que o Brasil não aceitou.
Então bastaria, talvez, como se sugere no livro, uma aproximação, suprindo-se as consoantes já sem qualquer valor fonético (exemplo: “acionar”, “exato”, “ótimo”) mas consentindo-se a existência de variantes com a consoante muda com interesse em cada país (caso, por exemplo, para Portugal, de “adoção/adopção”, “Batista/Baptista”.
Contudo, os simplificacionistas que nessa altura pontificavam nas Academia quiseram, no designado Projeto de 1986, acabar drástica e imprudentemente com todas as diferenças. Recusada a insensatez (dado os idiomas já se terem enriquecido tanto em separado), mas como “era preciso não desistir”, voltaram a uma solução transportada da anterior, só que dita menos forte: o AO90.
Nessa nova proposta dos unificadores, mesmo com imperfeições, havia, no entanto, uma cláusula de segurança considerada indispensável: o acima citado “Vocabulário Comum” (VC) prévio. Ora, cláusula que foi, pelos então apressados (depois de o AO90 ter ficado na gaveta durante vinte anos por não haver o VC) propositadamente relegada para se poder avançar na implantação do AO90, ...mesmo sem o VC.
É este, como se diz no livro, entre todos, o pecado mesmo capital da aplicação do AO90 em Portugal, quanto ao efeito perverso na supressão generalizada das consoantes das sequências internas, com gravíssimas confusões entre as consoantes que ficam e as que se suprimem.
Nesta deficiência de base para se poder aplicar o AO90, não se percebe com que autoridade o Vocabulário abusivo, imposto pelo Governo de Sócrates para o país, obriga em Portugal que sejam adotadas exclusivamente as variantes sem a consoante etimológica na quase generalidade destas palavras, com o pretexto de seguir o critério fonético, divisionista na língua e que provoca retornos da grafia sobre a fonia, na pronúncia de Portugal, quando a consoante é útil para abrir a vogal anterior.
Assim, nos vocábulos da lista atrás, os utentes da língua em Portugal que continuam a preferir a equilibrada norma de 1945 estão perfeitamente legais no “espírito do AO90”.
Mas os transportes dos disparates de 1986 para o AO90 tiraram, também inutilmente, virtualidades da língua. Por exemplo:
Na confusão entre compostos e locuções, como em “braço-de-ferro” erradamente escrito sem hífenes, pois o sentido é figurado, um grupo diferente de “casa de jantar”, uma locução, com as palavras no sentido real.
Na ausência de acentos como em “pára” e “pêlo”, que provocam ambiguidades com respetivamente a preposição “para” e a contração “per + o”: “pelo”, vocábulos muito frequentes num texto.
Assim, o livro, num critério de meio-termo, embora aceitando as simplificações sensatas do AO90, recomenda também que se respeite o que era positivo na Norma de 1945 e continua bem aceite pelas comunidades escolarizadas.
Sublinha-se, finalmente, o que foi indicado no 2.8 do capítulo 9 do livro:
O autor não apresenta este trabalho com a esperança de que tenha reconhecimento oficial, mas unicamente que, nas suas críticas e sugestões, possa ter utilidade no estabelecimento de um vocabulário que efetivamente proteja a nossa variedade na língua.
D’ Silvas Filho