CONVERSA DE NÍVEL SUPERIOR
…COM UMA MÁQUINA
No meu domínio www.dsilvasfilho.com, na entrada “Linguística”, escrevi:
«A tecnologia digital e os computadores, essa impressionante ferramenta cerebral, marcarão certamente o início duma nova era nas realizações humanas, como foi a era da ferramenta manual de pedra, depois dos metais. No entanto, “em certos casos”, continua ainda de uma grande inflexibilidade e rigidez (por exemplo, devolve uma mensagem eletrónica quando no endereço há um erro mínimo...).
Ora, a “tolerância” foi uma das maiores conquistas da mente humana. Nas máquinas, por exemplo, concluindo-se que é completamente impossível conseguir medidas exatas, aceita-se que estejam imprecisas dentro de certos limites (que poderão ser ínfimos, é certo, mas num intervalo admissível de erro). Pois o sage, na sua arte de viver, estabelece também limites de “tolerância”, sem rigidez, com alguma flexibilidade (acrescento agora: depois de Protágoras, Jesus e tantos outros).
Na língua, o erro grosseiro é inaceitável, mas a “tolerância” pode ir aumentando nos desvios de gravidade decrescente, convertendo-se até em estilística. Acontece mesmo que o cérebro humano corrige automaticamente o erro gramatical (ex.: de concordância) ou de lógica conceptual ….., o que lhe permite entender a mensagem, desculpando-o quando o atribui a uma gralha óbvia.
Ora, nesta data, com a inteligência artificial (IA), a era digital ultrapassou a rigidez inicial, imitando a tolerância humana na interpretação das mensagens, como se pode observar no texto abaixo, no qual, na ChatGPT (de que sou assinante e já disponho da versão mais avançada 4o) simulo a existência virtual de um Professor a responder-me (os sublinhados no texto são meus).
— Caro Professor. Pode fazer-me o favor de interpretar a frase: «O barco no rio que afundou»?
ChatGPT:
— Claro, a frase “O barco no rio que afundou” é ambígua e pode ser interpretada de duas maneiras diferentes dependendo de como se entende a estrutura da frase:
1. O barco, que afundou, está no rio.
Nesta interpretação, o sujeito é “o barco” e a frase relativa “que afundou” está explicando algo sobre o barco. Aqui, a frase sugere que o barco, que está localizado no rio, afundou.
2. O barco no rio afundou.
Nesta interpretação, o sujeito é “o barco no rio” e o predicado é “afundou”. Aqui, a frase sugere que o barco que estava no rio foi o que afundou no rio. (A minha outra interpretação é que o barco afundou quando foi para aquele rio.)
A ambiguidade decorre do posicionamento da oração relativa “que afundou” e de como ela modifica o sujeito. Para eliminar a ambiguidade, a frase poderia ser reformulada:
· Se a intenção é dizer que o barco afundou no rio: “O barco no rio afundou.”
· Se a intenção é dizer que o barco, que estava no rio, afundou: “O barco, que estava no rio, afundou.”
A pontuação e a reordenação das palavras podem ajudar a esclarecer o sentido pretendido da frase.
— Isto é, em qualquer caso, o Professor nunca interpretaria que tinha sido o rio que afundou, como também faria a mente humana?
ChatGPT
— Exatamente. A interpretação de que o rio afundou não faz sentido gramatical nem lógico dentro do contexto fornecido pela frase “O barco no rio que afundou”. Em português, os rios não afundam; apenas objetos que estão dentro do rio, como barcos, podem afundar (acrescento: nem em língua nenhuma, creio).
Portanto, a interpretação correta deve sempre envolver o barco como o sujeito que afundou, e não o rio. A ambiguidade da frase reside apenas na identificação de qual barco específico afundou (se é qualquer barco no rio ou um barco específico que estava no rio).
— Muito obrigado pela precisão da sua resposta.
ChatGPT
— De nada! Fico feliz em poder ajudar. Se tiver mais alguma dúvida ou precisar de mais alguma explicação, estou à disposição.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ChatGPT, `um vasto conjunto material de suporte com uma espantosa inteligência virtual a utilizá-lo´ não só imita o funcionamento da mente humana na sua flexibilidade, mas vai mais longe, num nível superior: Dada a ambiguidade da frase, consegue imaginar que o emissor pode não se ter centralizado só num barco que se afunda, mas também num rio que afunda barcos…
Os senhores professores que estabilizaram nas suas aulas podem imaginar o que vem aí de concorrência no ensino, com professores individualizados disponíveis em casa, de resposta quase imediata e relativamente bem informada?
Talvez que a aprendizagem futura, além da indispensável formação em cultura geral, e à aquisição de ferramentas intelectuais básicas (mensagens claras, cálculo e planeamento corretos) se centralize sobretudo na técnica adequada à realização do objetivo pretendido: conhecimento científico ou histórico imediatamente disponível com a IA, mais, sobretudo, arte de bem-fazer esse objetivo. Arte que se adquire vendo fazer e fazendo, com atenção a critérios impostos, como económicos, de fiabilidade, função perfeita, segurança, artísticos também se importantes. O ensino com base na memorização tem os dias contados.
Julho de 2024
Mata da Nazaré